segunda-feira, 19 de julho de 2010

Organismos geneticamente modificados: Estados-Membros assumem total responsabilidade pela presença das culturas no seu território

A Comissão Europeia propôs no passado dia 13 de Julho conceder aos Estados-Membros liberdade para autorizar, restringir ou proibir o cultivo de organismos geneticamente modificados, na totalidade ou em parte dos seus territórios. As medidas adoptadas, que mantêm o sistema de autorização da União Europeia com base em dados científicos, assumem a forma de uma comunicação, de uma nova recomendação sobre a coexistência de culturas geneticamente modificadas com as culturas tradicionais e/ou biológicas e de uma proposta de regulamento que prevê a revisão da legislação sobre organismos geneticamente modificados. A nova recomendação vem dar mais margem de manobra aos Estados-Membros, tendo em conta as suas especificidades locais, regionais e nacionais quando da adopção de medidas sobre a coexistência de culturas. O regulamento proposto altera a Directiva 2001/18/CE de forma a permitir aos Estados‑Membros restringir ou proibir o cultivo destes organismos no seu território.
(Desenvolvimento em IP/10/921 e MEMO/10/325)
Na sequência desta proposta, a Comissão Europeia está a ser acusada de provocar o caos, como contam Isabel Arriaga e Cunha neste artigo do Público :
Fragmentação do mercado interno, renacionalização da política agrícola, abdicação de responsabilidades: as críticas choveram ontem de todos os lados contra a proposta da Comissão Europeia de deixar aos governos dos Vinte e Sete a responsabilidade de autorizar, ou não, o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM) no seu território.
A proposta pretende desbloquear o impasse total em que mergulhou o debate sobre a autorização de cultivo de transgénicos na UE, que continua a suscitar a oposição da opinião pública europeia. 
A controvérsia não permitiu à UE autorizar mais que o cultivo do milho MON810 da multinacional Monsanto para a alimentação, em 1998, e, desde o início do ano da batata Amflora da BASF para a indústria. 
Seis países produzem o MON 810 – Portugal, Espanha, Polónia, República Checa, Eslováquia e Roménia – mas oito, incluindo a França e Alemanha, são contra e aplicam uma cláusula de salvaguarda para impedir o cultivo.
Para ultrapassar os vetos cruzados dos dois grupos, Bruxelas propõe que os governos hostis aceitem dar luz verde ao cultivo ao nível europeu, em troca de passarem a ter a liberdade de decidir sobre o que fazer no seu território.
A proposta constitui “uma abdicação de responsabilidades, prejudica a integridade do mercado interno e abre um precedente perigoso na busca de soluções comuns para outras questões transfronteiriças”, acusou Guy Verhofstadt, presidente do grupo liberal (ALDE) do Parlamento Europeu. “O que é que vem a seguir? Vamos desistir de acordar uma patente comunitária ou deixar os Estados membros fixar as suas próprias quotas de pesca? Este é um dia triste para a integração europeia e deve ser combatido por todos os que defendem o método comunitário de tomada de decisão”, insurgiu-se.
Bruno Le Maire, ministro francês da agricultura, manifestou-se igualmente contra “a renacionalização das decisões” europeias em matéria de OGM. 
Os Verdes europeus consideram, por seu lado, que a proposta representa uma boa “dose de caos”, lembrando que o risco de contaminação das culturas convencionais pelos transgénicos “não pára nas fronteiras”. Os Verdes contestam aliás fortemente o sistema de aprovação dos OGM que está a cargo da Agência Europeia para a Segurança Alimentar (EFSA): um estudo da organização de investigação alemã Testbiotech encomendado pelos Verdes, acusa a EFSA de basear as suas conclusões em matéria de OGM em “investigações empíricas, considerações e assumpções”. O problema, afirmam os seus peritos, está em que a EFSA analisa os OGM por comparação com os produtos equivalentes convencionais, ignorando assim “o vasto leque dos seus efeitos involuntários, dos quais alguns causados pelo método de transferência de genes que escapa ao mecanismo de regulação dos genes das plantas”.
Até mesmo a organização representativa das multinacionais do sector, Europabio, criticou Bruxelas, afirmando que a proposta “é decepcionante” e vai criar uma grande “incerteza jurídica” na UE.

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