Sendo a Quercus a associação nacional de conservação da natureza e numa lógica de aproximação aos associados e cidadãos em geral, por parte do núcleo de São Miguel, inicio, com este artigo, uma colaboração regular com os órgãos de comunicação social, tentando fazer uma abordagem geral do estado do ambiente nesta ilha, de forma a assinalar o dia nacional da conservação da natureza.
Começando pelo associativismo ambiental, é notória uma crise de participação e de reponsabilização cívica, o que não deixa de ser curioso, pois contraria o sentimento individual das pessoas, na medida em que estas, na sua essência, desejam participar, especialmente ao nível do ambiente. Ora, defendo uma maior aproximação e abertura às pessoas, bem como acredito que não há donos ou exclusividade na defesa desta nossa riqueza. É necessário um maior debate público dos temas e projectos ambientais, antes de os consumar. Todos somos poucos para este objectivo e a entrada de novos dirigentes para as organizações não governamentais, bem como a criação de movimentos cívicos, só vêm enriquecer esta luta e esta responsabilidade que é (deveria ser) de todos nós. Gostaria igualmente de deixar um alerta relativo aos apoios concedidos às ONG, pois como já referi anteriormente, temos um mecanismo pernicioso, pois a associação que critica é a mesma que depende dos fundos para a sua sobrevivência. Importa rever este aspecto e incluí-lo na nova lei que se está a preparar.
Educação ambiental precisa-se, é certo, mas atente-se nos seguintes exemplos:
1) Ferraria: Arrasa-se com um edifício histórico, com toda a envolvente e de certeza, teremos mais construções de pertinência questionável e carregadas de betão. Mais uma vez não aproveitamos a singularidade das nossas ilhas. Assim se consegue perceber que o índice de construção na orla costeira ronde os 15%, com obras, permitam-me acrescentar, de duvidoso enquadramento paisagístico e com uma péssima avaliação custo/benefício, sendo o custo sempre em sacrifício do ambiente e da integração paisagística;
2) Fajã do calhau: palavras para quê? Pelo menos ficamos “sem as plantas invasoras”...;
3) As vias SCUT esventram a nossa terra, sem se preocuparem com nascentes, àrvores centenárias, entre muitos outros atentados, numa lógica de “é sempre em frente, dê por onde der”. Não questionámos acessibilidades, mas sim os impactos ambientais e a integração paisagística. Felizmente, após contestação, conseguiu-se reduzir o abate de centenas de árvores a apenas doze. É um exemplo da sensibilidade governamental (caso ninguém se pronunciasse..). Tal como o é o da integração paisagística, pois “plantando plantas endémicas e plantas ornamentais” o assunto fica resolvido. Outro exemplo foi a tentativa de colocar os quatro milhões de m3 de terra em linhas de àgua, em terrenos com cotas superiores à da estrada, próximas das populações (pondo estas em perigo) e que em última análise, acabariam por escoar para o mar. Não satisfeitos, agora querem colocar estes inertes em terrenos de produção agrícola. Importa aproveitar esta oportunidade única para corrigir os inúmeros “crimes” ambientais, em zonas de extracção de bagacinas, por exemplo, minimizando o impacto causado pela mão do homem.
4) Em relação aos resíduos, basta circularmos pela ilha, junto à nossa costa, para percebermos que ainda hoje, não conseguimos dar uma resposta cabal a esta problemática. É necessária uma maior acção pedagócica e fiscalizadora. E porque não pensarmos em tratar cá na ilha, os nossos próprios resíduos? Há bons exemplos.
5) No que respeita aos recursos hídricos, a urgência em prevenir/remediar a falta de àgua que já existe nas nossas ilhas tem que passar pela aposta na modernização e requalificação da rede de captação e transporte de água, bem como na não destruição das turfeiras, na plantação de mais árvores e preservar as florestas. Outras acções são igualmente importantes, não esquecendo que grande parte da nossa biodiversidade foi e é arrasada com arroteias.
6) Em pleno séc. XXI, não se admite que existam situações como a que se vive no Cabouco. Urge arranjar uma solução técnica para as suiniculturas, cujos maus cheiros afectam também as populações da Lagoa. A fiscalização tem que actuar e ser consequente, não se limitando à elaboração de relatórios.
7) Não se pense que a Lagoa do Fogo está a salvo. Apesar de ser intenção do governo a elaboração de um plano de ordenamento da bacia hidrográfica, todas as opções estão em aberto. Não nos esqueçamos que o mesmo plano para as Sete Cidades prevê a asfaltagem de toda a zona circundante e para as Furnas a construção de passadiços em madeira em algumas margens da Lagoa. É necessário unirmo-nos e não deixarmos que isto aconteça.
8) Em relação à legislação ambiental, tenta-se relegar para segundo plano as preocupações ambientais, dando primazia às de natureza económica, contrariando a lógica de que melhor ambiente, melhor turismo e assim “criaremos saudades e ficaremos a ganhar”. É claro o que os turistas querem. Que tal apostarmos no turismo rural, em que os próprios turistas participam nas actividades agrícolas? Não é uma ideia nova, mas tem tido muito sucesso noutros países, permitindo o binómio desenvolvimento-preservação do ambiente, pois deixaremos de apostar em obras megalómanas.
Como poderemos promover uma verdadeira educação ambiental da população, da importância da reciclagem, da defesa do ambiente, quando depois tudo cai por terra, numa subordinação à política dos orgãos do poder, traduzida no “faz o que digo, mas não faças o que eu faço”?
Há que existir um equilíbrio mais racional entre o ambiente e o desenvolvimento dos Açores, deixando de olhar para o ambiente como algo que limita, mas sim como algo que deverá ser integrado no desenvolvimento. A bem da nossa terra e das nossas gentes.
É necessário proteger a nossa flora endémica e efectuar uma defesa séria das zonas protegidas e reservas naturais, limitando nestes autênticos “santuários”, a intervenção do homem e a introdução de plantas exóticas/infestantes, preservando desta forma, os respectivos habitats.
Neste dia importa também enaltecer o esforço de alguns, nomeadamente o anterior Projecto Life Priolo e o actual projecto Life, que tão bons resultados têm alcançado na recuperação do habitat do Priolo e na defesa da floresta natural de altitude - endémica.
A recolha selectiva de resíduos porta-a-porta em curso no concelho de Nordeste e em fase experimental em Ponta Delgada; a estação de vermicompostagem no concelho do Nordeste, que permite um tratamento dos resíduos de uma forma amiga do ambiente e a rede de ecotecas, são alguns exemplos positivos. No entanto é preciso mais, muito mais.
Termino, constantando que estamos cada vez mais distantes do objectivo de estancar a perda de biodiversidade até 2010. Esta e outras conclusões fazem parte de um recente relatório da Comissão Europeia, em que refere que estão “particularmente ameaçados os ecossistemas agrícolas, as zonas húmidas e a orla costeira”. Mais, o relatório mostra que “os habitats dependentes da gestão agrícola e agro-florestal estão particularmente ameaçados(...). As pastagens extensivas e os pousios, habitats muito importantes para a natureza, estão particularmente ameaçados pela intensificação e pelo abandono agrícola.” Alerta também para o que foi a posição da Quercus São Miguel em relação às zonas protegidas, pois “falta investimento na Rede Natura 2000, em instrumentos financeiros que apoiem os agricultores que optam por práticas amigas da natureza.”
Só me resta lançar um apelo para que se juntem a nós nesta causa. Podem contar connosco.
Começando pelo associativismo ambiental, é notória uma crise de participação e de reponsabilização cívica, o que não deixa de ser curioso, pois contraria o sentimento individual das pessoas, na medida em que estas, na sua essência, desejam participar, especialmente ao nível do ambiente. Ora, defendo uma maior aproximação e abertura às pessoas, bem como acredito que não há donos ou exclusividade na defesa desta nossa riqueza. É necessário um maior debate público dos temas e projectos ambientais, antes de os consumar. Todos somos poucos para este objectivo e a entrada de novos dirigentes para as organizações não governamentais, bem como a criação de movimentos cívicos, só vêm enriquecer esta luta e esta responsabilidade que é (deveria ser) de todos nós. Gostaria igualmente de deixar um alerta relativo aos apoios concedidos às ONG, pois como já referi anteriormente, temos um mecanismo pernicioso, pois a associação que critica é a mesma que depende dos fundos para a sua sobrevivência. Importa rever este aspecto e incluí-lo na nova lei que se está a preparar.
Educação ambiental precisa-se, é certo, mas atente-se nos seguintes exemplos:
1) Ferraria: Arrasa-se com um edifício histórico, com toda a envolvente e de certeza, teremos mais construções de pertinência questionável e carregadas de betão. Mais uma vez não aproveitamos a singularidade das nossas ilhas. Assim se consegue perceber que o índice de construção na orla costeira ronde os 15%, com obras, permitam-me acrescentar, de duvidoso enquadramento paisagístico e com uma péssima avaliação custo/benefício, sendo o custo sempre em sacrifício do ambiente e da integração paisagística;
2) Fajã do calhau: palavras para quê? Pelo menos ficamos “sem as plantas invasoras”...;
3) As vias SCUT esventram a nossa terra, sem se preocuparem com nascentes, àrvores centenárias, entre muitos outros atentados, numa lógica de “é sempre em frente, dê por onde der”. Não questionámos acessibilidades, mas sim os impactos ambientais e a integração paisagística. Felizmente, após contestação, conseguiu-se reduzir o abate de centenas de árvores a apenas doze. É um exemplo da sensibilidade governamental (caso ninguém se pronunciasse..). Tal como o é o da integração paisagística, pois “plantando plantas endémicas e plantas ornamentais” o assunto fica resolvido. Outro exemplo foi a tentativa de colocar os quatro milhões de m3 de terra em linhas de àgua, em terrenos com cotas superiores à da estrada, próximas das populações (pondo estas em perigo) e que em última análise, acabariam por escoar para o mar. Não satisfeitos, agora querem colocar estes inertes em terrenos de produção agrícola. Importa aproveitar esta oportunidade única para corrigir os inúmeros “crimes” ambientais, em zonas de extracção de bagacinas, por exemplo, minimizando o impacto causado pela mão do homem.
4) Em relação aos resíduos, basta circularmos pela ilha, junto à nossa costa, para percebermos que ainda hoje, não conseguimos dar uma resposta cabal a esta problemática. É necessária uma maior acção pedagócica e fiscalizadora. E porque não pensarmos em tratar cá na ilha, os nossos próprios resíduos? Há bons exemplos.
5) No que respeita aos recursos hídricos, a urgência em prevenir/remediar a falta de àgua que já existe nas nossas ilhas tem que passar pela aposta na modernização e requalificação da rede de captação e transporte de água, bem como na não destruição das turfeiras, na plantação de mais árvores e preservar as florestas. Outras acções são igualmente importantes, não esquecendo que grande parte da nossa biodiversidade foi e é arrasada com arroteias.
6) Em pleno séc. XXI, não se admite que existam situações como a que se vive no Cabouco. Urge arranjar uma solução técnica para as suiniculturas, cujos maus cheiros afectam também as populações da Lagoa. A fiscalização tem que actuar e ser consequente, não se limitando à elaboração de relatórios.
7) Não se pense que a Lagoa do Fogo está a salvo. Apesar de ser intenção do governo a elaboração de um plano de ordenamento da bacia hidrográfica, todas as opções estão em aberto. Não nos esqueçamos que o mesmo plano para as Sete Cidades prevê a asfaltagem de toda a zona circundante e para as Furnas a construção de passadiços em madeira em algumas margens da Lagoa. É necessário unirmo-nos e não deixarmos que isto aconteça.
8) Em relação à legislação ambiental, tenta-se relegar para segundo plano as preocupações ambientais, dando primazia às de natureza económica, contrariando a lógica de que melhor ambiente, melhor turismo e assim “criaremos saudades e ficaremos a ganhar”. É claro o que os turistas querem. Que tal apostarmos no turismo rural, em que os próprios turistas participam nas actividades agrícolas? Não é uma ideia nova, mas tem tido muito sucesso noutros países, permitindo o binómio desenvolvimento-preservação do ambiente, pois deixaremos de apostar em obras megalómanas.
Como poderemos promover uma verdadeira educação ambiental da população, da importância da reciclagem, da defesa do ambiente, quando depois tudo cai por terra, numa subordinação à política dos orgãos do poder, traduzida no “faz o que digo, mas não faças o que eu faço”?
Há que existir um equilíbrio mais racional entre o ambiente e o desenvolvimento dos Açores, deixando de olhar para o ambiente como algo que limita, mas sim como algo que deverá ser integrado no desenvolvimento. A bem da nossa terra e das nossas gentes.
É necessário proteger a nossa flora endémica e efectuar uma defesa séria das zonas protegidas e reservas naturais, limitando nestes autênticos “santuários”, a intervenção do homem e a introdução de plantas exóticas/infestantes, preservando desta forma, os respectivos habitats.
Neste dia importa também enaltecer o esforço de alguns, nomeadamente o anterior Projecto Life Priolo e o actual projecto Life, que tão bons resultados têm alcançado na recuperação do habitat do Priolo e na defesa da floresta natural de altitude - endémica.
A recolha selectiva de resíduos porta-a-porta em curso no concelho de Nordeste e em fase experimental em Ponta Delgada; a estação de vermicompostagem no concelho do Nordeste, que permite um tratamento dos resíduos de uma forma amiga do ambiente e a rede de ecotecas, são alguns exemplos positivos. No entanto é preciso mais, muito mais.
Termino, constantando que estamos cada vez mais distantes do objectivo de estancar a perda de biodiversidade até 2010. Esta e outras conclusões fazem parte de um recente relatório da Comissão Europeia, em que refere que estão “particularmente ameaçados os ecossistemas agrícolas, as zonas húmidas e a orla costeira”. Mais, o relatório mostra que “os habitats dependentes da gestão agrícola e agro-florestal estão particularmente ameaçados(...). As pastagens extensivas e os pousios, habitats muito importantes para a natureza, estão particularmente ameaçados pela intensificação e pelo abandono agrícola.” Alerta também para o que foi a posição da Quercus São Miguel em relação às zonas protegidas, pois “falta investimento na Rede Natura 2000, em instrumentos financeiros que apoiem os agricultores que optam por práticas amigas da natureza.”
Só me resta lançar um apelo para que se juntem a nós nesta causa. Podem contar connosco.
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